A osteocondrose em equinos (OC) é uma lesão ortopédica do desenvolvimento caracterizada por uma anomalia na ossificação endocondral, ou seja, uma falha na ossificação durante o desenvolvimento. Pode originar frequentemente dois tipos de apresentação: Osteocondrite Dissecante (OCD) e Lesões Císticas Subcondrais (LCS).
A OCD é uma forma de osteocondrose em que um fragmento de cartilagem se solta e invade o espaço articular. Esse fragmento, também chamado de “flap” pode ser nutrido pelo líquido sinovial e até mesmo se mineralizar. Quando o fragmento se solta, o local de origem será substituído por tecido de granulação e, subsequentemente, ocorrerá o desenvolvimento de fibrocartilagem.
Já os cistos ósseos subcondrais se formam onde há persistência de áreas com cartilagem degenerada no osso subcondral, que ao invés de se destacarem originando a OCD, acabam se aprisionando e dando origem às lesões císticas subcondrais (LCS).
A osteocondrose em equinos possui etiologia multifatorial, ou seja, pode ser originada por diversas causas, sendo os fatores genéticos, nutricionais, endócrinos e biomecânicos os principais desencadeantes da lesão. Acomete os equinos em fase de crescimento e com maior incidência em raças utilizadas para finalidades esportivas.
Principais causas da Osteocondrose em Equinos
Genética
A predisposição genética pode atuar tanto diretamente no aparecimento da OC, referindo-se a um defeito genético específico na ossificação endocondral e indiretamente, quando os fatores hereditários predispõem para rápido crescimento e elevado peso corporal.
Rápido crescimento
Epidemiologicamente pode-se perceber que os animais maiores e mais precoces de um plantel são, na maioria das vezes, os mais afetados pela osteocondrose. Esse crescimento pode ser por capacidade genética ou ingestão de elevados níveis de energia, ambos resultando em falha na ossificação endocondral.
Fator Nutricional – Carboidrato
A ingestão excessiva de energia pelos potros em desenvolvimento promove um crescimento rápido, com ganho de massa muscular desproporcional ao desenvolvimento do sistema osteoarticular. O consumo excessivo de carboidrato durante a fase de crescimento diminui o conteúdo mineral, consequentemente a densidade do osso, favorecendo o aparecimento da OC.
Fator Nutricional – Proteína
A matriz óssea é composta por cerca de 20% de proteína, portanto o fornecimento de uma dieta pobre em proteínas pode comprometer o desenvolvimento osteoarticular.
Fator Nutricional – Cálcio e Fósforo
O balanço mineral de cálcio e fósforo é fundamental para o desenvolvimento normal do sistema osteoarticular. Em desequilíbrio desses minerais ocorre espessamento da cartilagem, diminuição da densidade e crescimento ósseo. Tão importante quanto à quantidade, é que estejam presentes na forma absorvível pelo organismo.
A ingestão de pastagens que contenham níveis consideráveis de oxalato de cálcio pode estar relacionada com o aparecimento de OC em haras de criação, visto que esse elemento induz ao desequilíbrio mineral por possuir ação quelante sobre o cálcio, impedindo a sua absorção intestinal.
O excesso de cálcio na dieta tem pouca influência na absorção de fósforo, no entanto, o excesso de fósforo tem influência significativa sobre a absorção de cálcio. Tendo em vista que o cálcio é absorvido no intestino delgado e o fósforo tanto no intestino delgado como no intestino grosso, nível em excesso de fósforo competirá por sítios de absorção, ocorrendo diminuição na absorção do cálcio.
O excesso de cálcio pode interferir na absorção de zinco, cobre e manganês, os quais atuam no metabolismo da cartilagem. Potros em desenvolvimento alimentados exclusivamente com alfafa podem desenvolver a doença visto que esta forragem apresenta teor elevado de cálcio e fósforo, nesse sentido, pode ocorrer deficiência na absorção desses micronutrientes.
Fator Nutricional – Microminerais
Baixas concentrações de cobre, zinco ou manganês no organismo podem resultar em alterações no sistema osteoarticular de várias espécies, inclusive nos equinos. Tais oligoelementos estão envolvidos no processo de calcificação da cartilagem.
Fatores Endócrinos
Vários hormônios também atuam no mecanismo de ossificação endocondral, sendo o hormônio do crescimento, a tiroxina (T4), o paratormônio, a calcitonina, o estrógeno, a testosterona e a insulina os principais hormônios que estimulam ou suprimem a proliferação dos condrócitos, a síntese de proteoglicanos, incorporação de sulfato e a calcificação da cartilagem. O desequilíbrio desses hormônios tem sido apontado como uma das causas da osteocondrose.
Traumatismos e fatores biomecânicos
O início do treinamento dos potros, coincidindo com o período de desenvolvimento ósseo, pode estar relacionado com a incidência de OC e lesões dissecantes. As raças de performance, como o QM, apresentam uma predisposição para o aparecimento da lesão. Admite-se que traumatismos osteoarticulares durante o exercício podem precipitar a clínica de OC, entretanto o seu envolvimento na indução primária das lesões é controverso. Os locais anatômicos onde ocorre maior stress osteoarticular são os mais acometidos pela osteocondrose, o que sugere possíveis fatores mecânicos.
O impacto sobre as estruturas osteoarticulares pode lesar capilares no osso subcondral, com isso levando à isquemia traumática e consequente degeneração.
Potros com excessiva musculatura ou ainda apresentando deformidades angulares e flexurais são mais predispostos à OCD, visto que, nesses casos, o impacto não se dissipa corretamente. Acredita-se que o trauma provoca falhas na vascularização local, consequentemente desencadeando necrose isquêmica.
Sinais clínicos da Osteocondrose em Equinos
Os sinais clínicos da osteocondrose nos equinos são difíceis de caracterizar por causa da grande variedade de lesões e locais envolvidos. Além disso, as lesões de osteocondrose nem sempre produzem sinais clínicos. Normalmente os animais demonstram sinais da doença somente quando colocados sob estresse biomecânico, comumente no início do treinamento em potros, quando apresentam dor, claudicação, efusão articular (inchaço) e redução do desempenho.
A claudicação pode estar ou não presente em equinos acometidos pela OC, ou seja, não é um sinal clínico obrigatório. Ela ocorre particularmente de acordo com o tipo de articulação e conforme a severidade da lesão
A efusão articular que ocorre em alguns casos é decorrente de sinovite secundária. Isso acontece principalmente nas articulações fêmuro-tíbio-patelar e tíbio-társica.
Diagnóstico da OC –
Osteocondrose em Equinos
Para o diagnóstico da Osteocondrose devem-se levar em consideração os sinais clínicos e os dados epidemiológicos que incluem: idade, articulação afetada, manejo nutricional e a presença de outros animais na propriedade apresentando sinais clínicos semelhantes.
Deve-se fazer um exame clínico completo do membro incluindo: observação, palpação, testes de flexão, extensão e bloqueios anestésicos. O bloqueio anestésico pode facilitar a identificação do local acometido e orientar o exame radiológico, principal exame utilizado no diagnóstico da OC.
Cerca de 60% dos equinos apresentavam comprometimento bilateral. Portanto, é de fundamental importância o exame no membro contralateral, mesmo que o membro não apresente sinais clínicos evidentes.
No exame radiográfico, visualizam-se com frequência fragmentos soltos ou outros sinais como achatamento ou irregularidade da superfície articular e radioluscência na placa óssea subcondral.
A ultrassonografia também pode ser indicada como método diagnóstico complementar, pois apresenta bastante sensibilidade na detecção de lesões articulares, desde que em locais em que seja possível o escaneamento.
Tratamento da Osteocondose em cavalos
O tratamento da osteocondrose pode ser conservativo ou cirúrgico, variando conforme a severidade dos sinais clínicos e articulação afetada.
O tratamento conservativo consiste basicamente no uso de anti-inflamatórios não-esteroidais, corticosteróides e condroprotetores e é indicado quando o diagnóstico da osteocondrose for precoce para os casos de lesões císticas subcondrais e nas lesões onde não se visualize a presença de “flaps” soltos no espaço articular.
A cirurgia é indicada para os casos de OCD que apresentam fragmentos de cartilagem no espaço articular, além de cistos ósseos que não responderam ao tratamento conservador. O procedimento cirúrgico pode ser realizado por artrotomia ou cirurgia artroscópica.
Alguns efeitos indesejáveis da artrotomia incluem: maior incisão, deiscência de pontos, formação de seromas, celulite, portanto na maioria das vezes, o pós-operatório apresenta maiores complicações que a cirurgia videoartroscópica.
A vídeoartroscopia é uma técnica de exploração por vídeo do interior da articulação que apresenta menos complicações quando comparada à técnica de artrotomia, tendo como vantagens um exame mais adequado e relativamente atraumático das cavidades sinoviais, redução do trauma cirúrgico, diminuição do período de convalescença e melhor prognóstico comparado com as técnicas convencionais de diagnóstico e procedimentos cirúrgicos tradicionais. A recuperação do paciente é mais rápida, obtendo-se menor cicatriz e melhor efeito cosmético.
OC – Prognóstico
O prognóstico varia em função da severidade da lesão, idade do cavalo, e início do tratamento. Nesse sentido, em animais mais jovens, com lesões menos severas, diagnóstico e tratamento precoce, melhor é o prognóstico. O prognóstico também varia conforme a articulação afetada.
Como prevenir a Osteocondrose em Equinos
Para estabelecer um programa de prevenção da osteocondrose é de fundamental importância o conhecimento das múltiplas etiologias. Nesse sentido procura-se controlar todas as variáveis que possam estar envolvidas no complexo etiológico da presente afecção.
As principais medidas a serem implantadas na propriedade incluem o controle da alimentação dos potros em crescimento para não exceder os níveis recomendados de energia na dieta. Com isso busca-se um controle sobre a taxa de crescimento e ganho de peso dos animais. Tão importante quanto à alimentação é estabelecer um programa de exercícios condizente com a idade e características individuais de cada animal. Outro fator fundamental é a análise da ração e pastagens para verificar se as mesmas possuem a concentração adequada de minerais e oligoelementos
A presença de osteocondrose na progênie também está relacionado com o fator genético. Nesse sentido, deve-se evitar utilizar em programas de reprodução animais portadores da doença.
Autor: Prof. Allison Maldonado
- Graduação em Medicina Veterinária pela UFPR;
- Especialização – Residência Médica em Clínica e Cirurgia de Equinos pelo EQUICENTER;
- Mestrado em andamento em Clínicas Veterinárias pela UEL;
- Coordenador da Pós-graduação em Medicina Esportiva Equina do IBVET.